SETE
CARTAS INÉDITAS DE
ANTÔNIO
FREDERICO OZANAM
A
TEÓFILO
FOISSET
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Anotadas
por Jean Morienval
Tradução
de Cfd. João Pedreira Duprat
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Bem
notória é a importância, na correspondência de Ozanam, das cartas por ele dirigidas
a Teófilo Foisset.
Este
amigo tão perto se acha do seu espírito como do coração. Abre-se ele assim a
Foisset tanto no que concerne aos seus mais íntimos sentimentos como sobre os
projetos que mais caros lhe são, trate-se de ação intelectual, de apostolado da
direção em geral da sua vida.
Entre
a correspondência já publicada, a primeira dessas cartas de Ozanam a Foisset
data de 21 de outubro de 1843. É apenas uma sequência, porquanto os dois amigos
mantinham relações desde alguns anos.
Ora,
estas cartas anteriores, até agora desconhecidas, a preciosa benevolência do
Cônego Maurer, vice-postulador da causa de Ozanam, para com "La Vie
Spirituelle" permite-nos apresentá-las hoje ao público.
Estendem-se
elas por três anos, datando a primeira de 12 de abril de 1840, quando a amizade
se formara entre Ozanam e Foisset, e a última, de 29 de maio de 1843, que
precede a de 21 de outubro e seguintes, já figurando na correspondência
conhecida.
Não
se nos torna preciso assinalar o vivo interesse ligado à publicação dessas sete
cartas inéditas, tanto em relação ao conhecimento do caráter de Ozanam como
para a história das idéias do seu tempo.
Não
sabemos como agradecer ao Sr. Cônego Maurer por haver dado as primícias à
"La Vie Spirituelle".
A
feliz oportunidade que nô-las faz publicar, nestes dias de aniversário da
fundação das Conferências de São Vicente de Paulo, permite que estas cartas
sejam particularmente significativas do espírito de Ozanam.
Desde
a primeira, encontraremos uma das expressões mais profundas que nos tenha
proporcionado de sua modéstia, modéstia real e não simulada que fazia com que o
animador das Conferências não ocupasse senão um posto humilde de confrade ou de
presidente de grupo. Quase em cada uma destas cartas, apresenta-se ele envolto
em suas alegrias e suas dores, e também com o sentimento cristão que de ambas
possuía.
O
amigo nelas se revela fiel e franco. Ainda que afetuoso, mostra-se ávido de
respeito para com o amigo mais velho que, humildemente, julga mais elevado e
melhor que ele.
Terno
e firme, mostra-se sempre atento e confiante.
Notar-se-á
de modo precípuo uma expressão quase angustiosa da caridade que desejava
praticar, mesmo em relação aos que não partilhavam de sua fé. Sentia ele um
ardente desejo de que se lhes rendesse a justiça a que tinham direito, e que
não fossem inutilmente ofendidos. Desejava que rancor algum proveniente do
setor católico lhes tolhesse a frutificação, sempre possível, da graça.
Defensor seguro e incorruptível da verdade, permanece equitativo e benevolente
em relação aos homens.
Não
é esta uma das grandes lições que nos ministra a sua vida?
O
período em que esta correspondência se enquadra é de relevo na vida de Ozanam. Quando da primeira destas cartas, tinha Ozanam vinte e sete anos, e já era
professor na Cadeira de Direito Comercial, criada especialmente para ele, em
sua cidade de Lião. Em seguida é nomeado, em Paris, suplente de Fauriel, a fim
de professar na Faculdade de Letras as literaturas comparadas.
Acabara
sua mãe de falecer, aos 14 de outubro de 1839, e estava êle prestes a desposar
Amélia Soulacroix. Já era, então, conhecido pela refutação do Sansimonismo,
pelos estudos sobre Bacon de Verulam e Tomás de Cantorbery, e, sobretudo, pela
tese sobre Dante e a Filosofia católica, no século XIII, que publicou em 1839.
Colaborou na Revue Européenne e no Univers, onde apresentou, de modo especial,
o relatório sobre as primeiras conferências de Lacordaire em Notre Dame.
Foi,
porém, sobretudo no domínio da ação católica que, a justo titulo, foi
considerado como chefe. Soube Ozanam tomar as mais felizes iniciativas. De
palestras filosóficas fez surgir grupos de crentes. Criou centros de estudos,
provocou a instituição das Conferências de Notre Dame e, de modo especial, deu
impulso ao movimento das Conferências de São Vicente de Paulo que, sete anos
após, já se haviam consideravelmente expandido ...
O brilho
jovem do seu saber e a fecundidade do apostolado empolgaram Teófilo Foisset
(1). Seja-nos permitido apresentar este correspondente de escol. Teófilo foi
por excelência, um homem de ligação, sempre alerta ao tratar-se de ação e
jamais em primeiro lugar na hora dos títulos e dos êxitos, deixando
a impressão de estar em segundo plano. Talvez, mas à condição de não ser tomado
por medíocre. Foi um alto espírito, possuindo verdadeiro talento literário.
"Que jornalista serias!" escreveu-lhe, um dia, Veuillot. E não se
tratava nem de complacência nem de hipérbole.
Preferia
Foisset residir na Província e continuar a carreira iniciada na magistratura,
"a que mais amava, assim se pôde dizer, depois da religião".
Toda
esta carreira desenvolveu-se em sua Borgonha natal, não a deixando senão em
breves viagens. A principio juiz de instrução em Beaune, aposentou-se como
Conselheiro da Côrte de Apelação de Dijon. Esculpiu, assim, uma bela figura de magistrado,
solidamente enradicado ao solo, segundo alta tradição.
Em
sua juventude estudantil, Foisset, já católico convicto e homem de ação, havia
sido o organizador em Dijon da Sociedade dos Bons Estudos. Foi aí que
Lacordaire retomou contacto com uma expressão viva do cristianismo. O próprio
Foisset definiu "o espírito de proselítismo" que, então, o animava e
que, disse ele, "arrasta-me para todos os jovens que prometem tornar-se
homens, na esperança de nêles encontrar auxiliares ou deles fazer
neófitos". Não menos, porém, se lançava, a fim de secundá-los, aos homens
de ação já experimentados, ambicionando encorajá-los com o seu próprio zelo.
Embora
permanecendo em sua províncía, onde bem jovem havia conhecido lisongeiros
sucessos nas academias locais, mantinha-se Foisset em contacto constante com
Paris. Colaborou no primeiro "Correspondant", de 1829 a 1831, na Revue
Européenne, que o sucedera, no Catholique do Barão de Eckstein, nos Annales de
Philosophie Chrétienne, de Bonnetty. A êle se devem diversas publicações
eruditas. Sempre atento ao que havia a fazer, conduziu várias campanhas,
animando, mesmo à distância, todos os que deviam falar e agir. Assim, atuou
eficazmente no sentido da restauração do ensino nos seminários menores, da
manutenção de numerosos bispados, ameaçados por uma aplicação estreita da
concordata, sem contar campanhas mais delicadas. Sua atividade, enérgica mas
prudente, fazia com que, sem se projetar a si mesmo, brilhassem e se pusessem
em ação todas as influências que se pudessem, utilmente, exercer. Foisset,
raramente em evidência, foi, muitas vezes, elemento primordial de muitos
empreendimentos.
Ainda
que habitando em Beaune, mantinha relações com todas as personalidades
católicas de sua época. Não tinha tido, porém, ensejo de encontrar-se com
Ozanam. Foi com o desejo de conhecê-lo que se dirigiu a Lião em 1840, em busca
do jovem amigo que considerava seu mestre. A mesma fé animava os dois homens.
Ozanam, porém, brilhava mais.
Não
possuímos pormenores da estada de Foisset em Lyon. Podemos imaginar que o
magistrado de Beaune, apaixonado pela ciência jurídica, muito se tenha
interessado pelo curso de direito comercial que, então, ministrava Ozanam. Foi,
com efeito, Foisset que, mais tarde, publicou as “Notas de um curso de Direito
Comercial”, com uma introdução que frisava: "Não se conheceria
perfeitamente Ozanam se não fosse ele conhecido como jurista".
Evidentemente,
porém, foi sobre a comum dedicação à causa católica quo se firmou, durante esta
visita, a amizade inalterável que os unia.
A
correspondência que publicamos tem início após esta visita.
Jean Morienval
(1) Nascido em Bligny_sous_Beaune, em
5 de março de 1800, e morto em Dijon aos 29 «e fevereiro de 1873, Conf. Teófilo
Foisset, por Henrique Boíssard, Paris. 1891.
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