Nossa Senhora das Graças
Em janeiro de 1819, com treze anos, Catarina fez sua primeira comunhão. Naquele radioso e comovente dia Catarina revela a sua irmã Tonine: "Hoje decidi tomar uma resolução. Eu também vou entrar para o convento".
Um dia, Catarina acordou de repente e confusa. Tivera um sonho curioso e belo. Assistia a Missa e ao final, o Padre celebrante lhe diz: "Segue-me" e lhe anuncia que Deus lhe reservara uma missão especial na terra. Não se esqueceria mais das feições daquele Padre. E, um dia, teria a satisfação de identificá-lo.
Tendo sua irmã Tonine completado vinte anos, Catarina julgou que podia transferir-lhe as responsabilidades da casa e assim realizar o seu sonho de ingressar numa Congregação religiosa. Vencendo sua timidez, dirigiu-se ao pai dizendo-lhe: "Senhor meu pai, bem sabeis que tenho recusado todas as propostas de casamento que me foram feitas." "É, papai, porque eu decidi entrar numa Congregação religiosa .. ". Pedro Labouré ficou perplexo. Não. Não permitiria que aquela filha também o deixasse. "Não dou meu consentimento, disse ele a Catarina". E continuou: "A família Labouré já deu ao convento uma filha. Duas, enquanto eu viver, não o permitirei".
O tempo foi passando e seu pai pensava diferente e não sentia nenhum constrangimento em afastar sua filha de Deus. E, para fazê-la mudar de ideia, em fins de 1828 a encaminha ao seu filho Carlos (o oitavo dos filhos) que em Paris possuía um restaurante, de frequência pouco recomendável onde Catarina deve ter passado alguns dos piores dias de sua vida. Tempos depois, Carlos vendo o sofrimento e angustia de sua irmã, a encaminha ao seu irmão Huberto, o mais velho dos irmãos, que era oficial militar e cuja esposa, Madame Joana Goutard era diretora de um colégio onde as famílias nobres da região educavam suas filhas.
Foi, pois, para um ambiente destes que Catarina se transferiu em fins de 1829. Assim, em pouco tempo, sua digna cunhada, apreciando seus modos e seu caráter, providencia uma professora que a ensina a ler e escrever.
Meses depois, Catarina visita o sanatório mantido pelas Filhas da Caridade e no parlatório vê um quadro e reconhece a pessoa que havia visto em sonho. Pergunta à Irmã que a atendia quem era a pessoa do quadro e a Irmã responde: “Oh! E o nosso Pai, São Vicente de Paulo, minha filha!”. Catarina sentiu-se arrebatada e uma imensa paz deu-lhe uma serena tranquilidade, e ali percebeu qual era o destino de sua vocação. Sentiu-se confortada de todas as amarguras passadas. Decidiu o caminho a seguir na vida. Iria ser religiosa. Havia, porém, três problemas a solucionar: o consentimento do pai, o enxoval necessário e o dote a ser pago.
Expondo essas dificuldades à sua cunhada, Joana Goutard, esta resolveu dar solução aos problemas, usando de seu prestígio e posição que ostentava na sociedade parisiense. Escreveu ao seu sogro e dele obteve o consentimento desejado. Ainda, Madame Goutard assumiu o enxoval e o dote a ser pago, e que, para a época, era um valor considerável. E assim, acompanhada de sua bondosa cunhada, Catarina, no dia 22 de janeiro de 1830, ingressou na Companhia das Filhas de Caridade. Terminado os meses de postulantado, Catarina foi transferida em 21 de abril de 1830 para a casa matriz e também seminário da comunidade em Paris, localizada na Rua Du Bac, 140, onde recebeu o hábito escuro das noviças.
Em 25 do mesmo mês, domingo do Bom Pastor, Catarina participou com centenas de Irmãs de Caridade da Solene Transladação das Relíquias de São Vicente de Paulo da Casa Matriz das Filhas da Caridade para a Capela dos Lazaristas, na Rua du Sevres. Catarina participou das imponentes cerimônias que se realizaram durante nove dias e foi durante a novena que ela em êxtase viu, em dias diferentes, o coração de São Vicente de Paulo mudar de cor, com significados diversos. Quase em todo o tempo do noviciado ela recebeu graças que a deixavam perplexa, quando nas celebrações da Missa, na consagração e elevação da hóstia, via Jesus.
“Insensivelmente cortei um pequenino bocado do pano e engoli-o". "Senti uma felicidade muito grande e roguei a São Vicente que me alcançasse a graça de ver a Virgem Santíssima". "Fui deitar-me com o pressentimento de que nessa noite eu me avistaria com minha boa Mãe". "Então adormeci e fui despertada
Muitas coisas foram ditas à Irmã Catarina durante a aparição, cujo diálogo durou cerca de duas horas. Deste longo colóquio entre Nossa Senhora e Irmã Catarina houve uma parte especial, o qual ela se lembraria, nos mínimos detalhes, por toda sua vida: "Minha filha, Deus te encarregará de uma grande missão". "Isso te atormentará e fará sofrer, mas se tiveres confiança e te inspirares em orações, tudo vencerás". "Os tempos são maus". "Virão desgraças sobre a França". "O trono será derrubado". "O mundo será revolvido por desgraças imensas, porém Deus e São Vicente estarão convosco e, nessa ocasião eu mesma vos ajudarei, concedendo-vos minhas graças". "Virá um momento em que tudo parecerá perdido, mas eu vos ajudarei". "Não será, porém, a mesma coisa com as outras comunidades". "O clero de Paris contará muitas vítimas, o senhor Arcebispo perecerá". "A Cruz será desprezada, o sangue correrá nas ruas, todo o mundo mergulhará na tristeza".
Referindo-se a Comunidade das Irmãs, assim observou Nossa Senhora: "Eu gosto de derramar minhas graças sobre a Comunidade". "Amo-a com ternura". "Ela, porém, me faz sofrer com os grandes abusos que nela se cometem". "A Regra não é observada, a regularidade não é perfeita". "Há grande relaxamento". "Comunica isto para quem está encarregado de tua direção espiritual". "Embora ele não seja o Superior, ele será, contudo, incumbido de fazer com que todas estas coisas se cumpram". "Dize-lhe em meu nome, que se proíbam as más leituras e a perda de tempo com visitas". "Logo que a observância da Regra voltar a ser praticada, uma outra Congregação virá se reunir à tua". "Não é conforme o costume, mas eu muito amo esta Congregação". "Dize-lhe, pois, que a receba". "Deus abençoará a união das duas Comunidades e haverá grande paz".
Conforme seu relato, Irmã Catarina disse não se lembrar de quanto tempo ficou junto à Virgem. Disse que sabia apenas que, quando Ela se foi, notou que alguma coisa, algo se afastava, como uma nuvem, em direção da tribuna, pelo mesmo caminho de onde havia vindo. Notou que o menino continuava onde o havia deixado. Voltaram para o dormitório onde as luzes continuavam acesas e com ele caminhando a sua esquerda. Eram duas horas da madrugada. Mas, durante o resto da noite, não conseguiu dormir e nem se esforçou para isso.
Irmã Catarina revelou todos os fatos e acontecimentos, em confissão, ao Pe. Aladel, que julgara a humilde camponesa fantasiosa, proibindo-a de "pensar em tais coisas". Porém, Irmã Catarina, depois de cumprir rigorosamente as ordens que recebera de sua santíssima Mãe, aguardava ansiosamente que lhe fosse revelada a missão que ela deveria executar. De outra parte, os acontecimentos previstos, próximos e futuros, aconteceram realmente, deixando o Pe. Aladel confuso diante da exatidão dos fatos, como o de 27 de julho quanto o Rei Carlos X foi deposto do trono da França.
Mas, Irmã Catarina, não precisou esperar muito tempo. No dia 27 de novembro de 1830, quando estava orando na capela, ouviu um ruído semelhante àquele que precedera a primeira aparição. Eram cinco horas e meia da tarde e ela olhou para o local de onde vinha o ruído e, maravilhada percebeu que chegara o grande momento. Ali estava, na altura de um quadro de São José, a Virgem Santíssima toda de "branco-aurora", com mangas cumpridas e um véu branco que descia até a parte inferior de suas vestes. Seus pés apoiavam-se na metade de um globo. Segurava outro globo na mão e tinha os olhos voltados para o céu.
Posteriormente, quando foi solicitada, Irmã Catarina disse que não se atreveria a descrever a puríssima beleza do rosto da Virgem Santíssima, que por sinal, afirmou estar bastante visível. Outra coisa que lhe chamou a atenção foi que Maria Santíssima trazia nós dedos vários anéis com belíssimas pedras, das quais partiam raios de luz de indescritível brilho, que iam aumentando à medida que desciam, confundindo em extraordinária claridade os pés da Virgem.
De repente, formou-se em torno da Virgem Maria, um quadro de forma oval, com inscrição, em ouro, nítida e destacada, das seguintes palavras: "Oh! Maria concebida sem pecado, rogai por nos que recorremos a vós". Enquanto Irmã Catarina contemplava a cena embevecida, uma voz ordenou-lhe: "Fazei cunhar uma medalha conforme este modelo. As pessoas que a trouxerem ao pescoço receberão muitas graças". “As graças serão abundantes para os que a trouxerem com inteira confiança”. Depois, Irmã Catarina pode ver o outro lado da medalha, cujo reverso deveria ter, a seguinte formação: um M encimado por uma cruz, tendo na parte inferior dois corações, um coroado de espinhos e o outro traspassado por uma espada. Doze estrelas completavam a composição, circundando os elementos da parte descrita.
Na verdade, o culto a Nossa Senhora das Graças acabara de ser sugerido como meio garantido para a obtenção das mais difíceis graças. Em outro dia durante sua meditação quando pensava sobre amedalha, Irmã Catarina ouviu uma voz que lhe esclareceu: "O M e os dois corações dizem bastante". Depois dessas manifestações de Nossa Senhora, Irmã Catarina transbordava de alegria e consolação, sem, porém, deixar a ninguém perceber na sua costumeira modéstia e simplicidade. A terceira aparição deu-se alguns dias após, no mesmo horário e depois da meditação. Percebeu o mesmo ruído de sedas da aparição anterior e vinha de próximo ao sacrário, ao mesmo tempo em que, uma voz lhe dizia interiormente: "Esses raios simbolizam as graças que a Virgem obtém para os que as imploram»! De outra feita foi lhe dito: "Vinde ao pé deste altar; aqui as graças serão concedidas aos grandes e aos pequenos". A verdade era que a Santíssima Virgem buscava por ao alcance dos homens e mulheres o poder que possuía junto ao seu divino Filho como Medianeira de Todas as Graças.
Quando em janeiro de 1831 recebeu o hábito e a "corneta”, espécie de véu em forma de chapéu, ainda continuava a ser tida como obscura até em questões de devoção. Se não se contasse, ninguém jamais acreditaria facilmente que aquela jovem freira fora escolhida para tão relevante missão. O próprio Padre Aladel, apesar de ter comprovado a veracidade de várias previsões que Irmã Catarina havia lhe contado, assim mesmo, quando ela lhe falava de suas visões, repreendia-a severamente, humilhando-a em várias ocasiões. Também, não se deve pensar que o Padre Aladel dormia tranquilamente. O germe da dúvida também o atormentava. Dizia ele: "Como poderia uma camponesa simplória e ignorante inventar uma oração extraordinariamente bela como essa que ela tanto me repete: "O' Maria concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a vós". "Além disso, não acredito que sua imaginação pudesse fantasiar metade das coisas que me tem narrado".
Porém, Irmã Catarina foi transferida para servir na cozinha do Asilo Enghien, destinada a abrigar a velhice desamparada. Desse modo teve que deixar aquele lugar tão significativo para ela. Mas Irmã Catarina de tempo em tempo iria a Casa-Mãe para receber orientação espiritual de seu confessor, Padre Aladel. Irmã Catarina chegou ao Asilo Enghien em 5 de fevereiro de 1831, ali permanecendo por todo o resto de sua vida.
Nosso Senhor Jesus Cristo mais uma vez mostrou ao mundo que "Quem se humilha será exaltado", concedendo a um a rude camponesa, cuja cultura fora objeto das maiores humilhações, mas que soube na sua simplicidade consagrar-se a vida inteira à Caridade, à piedade, à fé e à virtude, levar ao conhecimento da humanidade que Deus concedera à Maria Santíssima o poder de ser a Medianeira de Todas as Graças. No início de 1876, Irmã Catarina Labouré teve o prenúncio de sua morte. Em setembro e outubro permaneceu acamada a maioria dos dias, com acessos de tosse e asma. Em novembro, milagrosamente foi a Rue du Bac fazer o retiro anual naquela sua querida capela das aparições. E, em 31 de dezembro recebeu os últimos sacramentos e após várias síncopes veio a falecer, aos 70 anos. Em 2 de dezembro de 1907 recebeu o título de Venerável e aos 28 de maio de 1933 foi beatificada por Pio XI. Todavia, como glória suprema, foi solenemente canonizada pelo Papa Pio XlI em 27 de julho de 1947.
Nenhum comentário:
Postar um comentário