FREDERICO OZANAM - CULTO A MARIA
É uma grande felicidade podermos estar aqui reunidos, como estamos, neste recinto acolhedor e amigo - jardim fechado - onde não chegam sequer os rumores próprios das grandes cidades, e onde, orientados por um ideal comum, nos é possível orar, pensar e falar, na presença d'Aquele que
prometeu estar entre os que se reunissem em Seu nome.
Procurando ser perfeitos e enaltecendo aqueles que o são, em busca de exemplos para reforma de nossa vida e de incentivo para todas as lutas, certamente estamos reunidos em nome de Jesus Cristo.
Aqui, cada ouvinte é um cristão, cada cristão um vicentino, todos os vicentinos veneram Frederico Ozanam, e é para eles que vamos falar sobre "Frederico Ozanam e sua
devoção à Virgem Santíssima.
Dentro deste silêncio que, mais do que de atenção é de união de almas, emerge, desde logo, a figura querida do
santo e lembramo-nos daquele "odor de catolicismo e
fraternidade" de que falava Ozanam, quando se referia às suas tão caras reuniões, as "Conferências" centro de estudos e
debates, de onde sairia aquela fagulha ardente de caridade que um dia incendiaria a França e o mundo.
Foi, com efeito, desse viveiro de aspirações cristãs que nasceu, em pleno mês ele maio, mês de Maria, a Sociedade de São Vicente de Paulo, concretizando em obras a grande fé de um pugilo de jovens tementes a Deus, que tiveram a coragem de transplantar no solo minado da corrupta cidade de Paris, as limpas raízes de uma árvore que já crescia demais nos
seus corações de vinte anos!
E como essas raízes levaram consigo o ardente e piedoso coração de Frederico Ozanam, decorridos mais de um século, suas frondes chegam até nós e, ainda hoje e até o
"amanhã" que não veremos, darão sombra a todos os deserdados e alimento a todos os famintos de pão e de Verdade!
É que Deus não poderia falhar com sua Providência nem deixar sem efeito as aspirações tão santas de seu dedicado filho que, na exaltação própria da juventude e cheio de incontrolável entusiasmo, escrevia a um d seus companheiros:
"Eu gostaria que todos os jovens de cérebro e coração se unissem para qualquer obra caridosa e que se formasse em todo o país uma grande associação generosa para alivio das classes populares".
E ainda:
"Que essa associação invadisse, não somente a França, mas o universo inteiro".
Quando esse ideal tão belo e arrojado transbordou, em palavras, do coração de Frederico Ozanam, para os corações também inflamados de seus companheiros, lançado estava o alicerce da Sociedade de São Vicente de Paulo!
É então que sobe à tona o grande, o acendrado amor que ele dedica à Maria Santíssima, devoção básica de sua vida, sem a qual para todas as almas virtuosas a fé se anula e as obras perecem ...
Assim como não se pode amar a Cristo sem amar ao Pai, não se pode amar o Filho sem venerar-lhe a Mãe, quando essa Mãe é a Mãe de Deus e nossa Mãe!
Desde logo propõe Ozanam seja a Sociedade colocada sob a proteção da Virgem e escolhida a magna festa de 8 de dezembro para ser, entre eles, especialmente honrada.
O grande amor que dedicava à Nossa Senhora, que palpitava em muitos de seus versos, que guiava todos os seus passos e inspirava todas as suas obras, precisava estar presente, também, no da em que o seu mais belo sonho se realizava.
Assim, a recitação da Ave-Maria junto às preces ordinária das reuniões foi outra homenagem prestada por ele à santa Mãe de Deus.
Se intentarmos segui-lo em suas múltiplas viagens não será como turista que o descobriremos em suas peregrinações às igrejas e catedrais, às basílicas e abadias, não medindo sacrifícios nem canseiras...
Encontra-lo sempre de joelhos aos pés das Virgem, que lhe aparecerá vestida de pedra ou talhada na madeira.eternizada no mármore ou nas telas dos mestres, coberta de prata ou vestida de veludo negro, com seu lenço rendado nas finas mãos e o punhal cravado no peito, tal como a viu em muitas capelas da Espanha...
Virgens de mãos postas e olhos baixos, de braços abertos e corações à mostra , chorando ou sorrindo, com o rosário preso à cintura ou o Menino Jesus ao colo... Maria, sempre Maria, que o abençoava e protegia e diante de quem Ozanam se esquecia do mundo e dos homens!
Catedral de Nossa Senhora de Chartres
Todas as indeléveis recordações dessas visitas, assim as gravava ele:
"Santa Virgem minha Mãe! que poderosa Senhora vós sóis! Em troca de vossa casa de Nazaré, quantas casas admiráveis vosso divino Filho v oz fez construir! Eu conhecia muitas e muito belas: Nossa Senhora de Colônia, de Santa Maria Maior, de Santa Maria de Florença e Nossa Senhora de Chartres. Mas era pouco por ao vosso serviço os italianos, os alemães, os franceses. Até os espanhóis, menos destros, abandonam suas espadas e se tornam pedreiros a fim de que tenhais uma morada entre eles".
"Virgem bondosa, que tais milagres obtivestes, alcançai, também, algo para nós e para os nossos. Consolidai esta frágil e avariada casa dos nossos corpos. Fazei subir até o céu o edifício espiritual de nossas almas".
Quem se dirige à grande Mãe de Deus com tanta simplicidade e afeto como se estivesse a escrever uma carta a um amigo distante, só pode ser alguém que, à força de muita dedicação, de muito carinho, de muita piedade, certamente já tinha conquistado o amor total de Maria. Porque, salvo excepções, a devoção à Maria Santíssima não se improvisa.
Quando temos a felicidade de possuir uma piedosa Mãe, podemos dizer que, desde o berço, ela nos é transmitida. Resta-nos conservar tamanha riqueza no decorrer da vida para assegurar nossa própria felicidade terrena e futura, tal como fez Ozanam.
Eis o esboço de um retrato de sua Mãe, delineado pelo padre Ozanam, seu irmão:
"Sua felicidade era, sobretudo, dar aos seus filhos as primeiras lições de piedade e de religião. A noite os fazia deitar sob suas vistas, habituando-os a fazê-lo com modéstia e lhes ditava a maneira de dar seus corações a Deus. Enfim, para adormecermos com os santos pensamentos, dizia algumas palavras sobre Deus, a Santa Virgem, o Anjo da Guarda e os santos, entremeando suas doces palavras com seus beijos de mãe que penetram até o fundo da alma e a perfumavam para sempre".
Portanto, o amor de Ozanam à Virgem teve suas profundas raízes no coração de sua mãe, essa mulher extraordinária, mãe de 14 filhos, que, além dos múltiplos deveres do lar , cumpridos todos com excepcional perfeição, ainda fazia sobrar tempo para dá-lo em visitas e vigílias, aos pobres e aos doentes na medida de suas forças, prolongadas, por virtude, até o heroísmo.
Dela , pois, herdou a bela devoção à Maria, e foi essa preciosa devoção que o salvaguardou de todos os perigos quando, deixando pela primeira vez o lar paterno, iniciou seus estudos na grande universidade de Paris.
Lá, a santa Mãe de Deus o amparou, quase que visivelmente, quando seu espírito foi atormentado por dúvidas contra a fé e angustiantes escrúpulos.
Isso aconteceu precisamente no dia em que, entrando num templo, cheio de tristeza, para pedir a Deus o amparo de que necessitava, viu num recanto obscuro, recolhido em humilde oração e profundamente inclinado, o grande Ampere, o gênio imortal da França que ele tanto admirava.
Estava vencida a crise e essa vitória lhe fora propiciada certamente por Maria que pagava amor com amor.
Num longínquo 15 de agosto, festa da Assunção de Nossa Senhora e onomástica de sua querida mãe, data por demais cara a Ozanam e a toda a sua família, compunha ele estes versos:
Nossa Senhora de Chartres
"Eu vi a santa Virgem no esplendor!
Sobre ela os serafins cheios de amor,
Inteiros derramavam seus tesouros.
Tão bela era que ninguém
Lhe assemelhava entre os santos!
E tantos eram seus encantos
Que parecia igual a Deus!
O arcanjo, que outrora a nova lhe dava:
"Que lhe nasceria um filho", diante dela estava
De pé e, desdobrando suas asas de ouro, cantava.
O coro dos eleitos todo inteiro se agitava ..
E os espaços do encantado céu enchendo:
Salve, cheia de graças! mil vozes iam redizendo.
Diante da vida de Frederico Ozanam - essa criatura privilegiada, cheia de inconfundíveis talentos, admirada e querida no seu tempo por grandes homens e notáveis pensadores, com tantas reservas de inteligência para desbaratar inimigos poderosos, terçando com tanta desenvoltura as armas da palavra, dos conceitos, das controvérsias, como verdadeiro esgrimista intelectual, - ficamos maravilhados ao constatar que nunca foi vencido pelo demônio do orgulho.
Quando o mundo lhe acena com um promissor futuro de glória, resolve votar-se aos pobres e tornar-se poder chegar aos pequeninos!
Vai aos lares humildes, entre rudes e analfabetos, a mesma simplicidade com que toma lugar na cátedra da Sorbonne, senta-se nos caixotes vazios - que são as cadeiras dos pobres, - para ouvir-lhes as histórias, atender-lhes os pedidos, fazer seus seus sofrimentos, reivindicar-lhes os direitos, dar-lhes o pão do corpo e da palavra de Deus!
Quem lhe terá ensinado tamanha humildade senão a humilde Virgem Maria, Aquela que pisou aos pés a serpente do orgulho, Aquela que é Mãe do próprio Deus e que nunca se lembra de seu glorioso lugar quando desce até a nossa miséria para ensinar-nos o verdadeiro caminho?
Essa humilde Virgem Maria é que o acompanha sempre nas tristezas, nas alegrias, nos trabalhos, nas
enfermidades. E ele lhe devolve com carinho as atenções.
Quando teve a felicidade de ser pai, deu à filha o nome de Maria, em honra da poderosa padroeira à qual atribuía esse feliz nascimento, conforme escreveu a um dos seus
amigos.
No momento de regressar a Paris escrevia também:
"Para os dois anos que me restam a passar na capital,
tomei a resolução de completa reforma moral. Coloquei meus desejos sob os auspícios da Mãe Celeste, confiando o resto ao
seu bel prazer". Era o dom de si mesmo. Nada mais faltava
Lhe ofertar...
Três meses antes de sua morte, Ozanam já bem doente, se lembra d'Ela nestes versos repassados de ternura:
"Nosso barco encalhado numa rocha
Espera pela onda que ao porto a levará
E a Virgem, a quem foi ele consagrado,
Parece que não ouve nossa voz ...
Mas, eis que a Virgem nos contempla
(e isto parece que basta para lhe despertar a esperança
quando exclama num transporte):
Dentro em pouco Jesus acordará!
Na véspera do dia da Assunção, prestes a encerrar sua curta passagem por esta terra, combalido pela insidiosa enfermidade que o prostrava no leito, há muito tempo, declarou aos seus que iria à Igreja assistir à santa missa e comungar em honra do triunfo de Maria.
Chegada a hora e apesar da extrema fraqueza, dispensa a carruagem que lhe trazem à porta, dizendo: Será talvez
este meu último passeio neste mundo. Quero que seja para visitar o meu Deus e Sua Mãe!
Com efeito, três semanas depois desta despedida, feita com tamanho sacrifício à sua Mãe Santíssima, com o que provou ainda uma vez a sua inabalável devoção, extinguia-se a grande e curta vida de Frederico Ozanam.
E o Padre Ozanam assim se refere à sua morte: "A Virgem Maria para celebrar solenemente o dia do Seu bem-aventurado nascimento, quis fazer entrar na eterna glória um dos seus mais diletos filhos.
Meus senhores: Já há um decreto de Introdução da causa de Frederico Ozanam, procedente da Sagrada Congregação dos Ritos, da cidade Eterna.
Sublinhamos, com imensa alegria, esta frase nele contida o que, por si só, vale uma tese:
"Sua vida, se bem que breve, foi prodigiosamente ativa,
santificada por admirável piedade, por fervorosa devoção à
santa Eucaristia, à Bem-aventurada Virgem e aos Santos, e, em mais alto grau, por sua caridade para com o próximo."
Quando um dia Frederico Ozanam subir aos altares, como esperam todos os pobres e todos os vicentinos do mundo, muito deverá à grande devoção que teve por Maria Santíssima!
SANTA MELlLLO DE MAGALHAES
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