A IMACULADA CONCEIÇÃO E A SOCIEDADE DE SÃO VICENTE DE PAULO
"O santo é um homem esculpido em bronze, mas em
bronze vivo; é um HOMEM, isto é, um Homem forte".
(OZANAM: Melanges, Saint Thomas de Cantorbery, p. 596).
O primeiro cuidado dos fundadores da Sociedade de São
Vicente de Paulo foi colocar o novo grêmio sob a proteção de Nossa Senhora.
Jovens católicos fervorosos conscientes de sua responsabilidade, desde logo
sentiram a necessidade do amparo da Virgem Santíssima, e sob o seu manto
protetor foram abrigar a sua novel Sociedade. E tudo isto, note-se, fez-se
com naturalidade, com o desejo sincero de, no novo apostolado,
procurarem imitar as virtudes excelsas da excelsa Mãe de Deus.
A iniciativa partiu de OZANAM. Diz a história da Sociedade:
"Quatro de Fevereiro de 1834 é uma data na vida da "Conferência de
Caridade": é o dia de seu batismo. Desde sua fundação se colocara sob a
proteção do grande santo que personifica a caridade e a humildade. Mas ela não
fora além. Ora, nesse dia LE PREVOST em nome de vários confrades, manifestou
o desejo de a Conferência se colocar de maneira mais íntima sob o
patrocínio de SÃO VICENTE DE PAULO, que lhe fosse dirigida uma invocação
no decorrer das orações, pronunciadas no início e fim das sessões, e.
que sua festa fosse celebrada solenemente pela Conferência. Esta proposta foi acolhida com entusiasmo e, a partir desse dia, a "Conferência de
Caridade" passou a denominar-se "CONFERÊNCIA DE SÃO VICENTE DE PAULO" . E continua a
narrativa:
"OZANAM por sua vez, manifestou o desejo de a obra se
pôr sob a proteção da SANTÍSSIMA VIRGEM, que a invocasse nas suas orações
e escolhesse uma de suas festas para honra-La de maneira especial. Sua
proposta foi adotada como a precedente, por unanimidade; acrescentou-se a
Ave-Maria às orações de cada sessão e escolheu-se a festa da IMACULADA
CONCEIÇÃO".
Deveria ser profunda a devoção de OZANAM pela IMACULADA
CONCEIÇÃO!
Devoção firme, traduzia a firme vontade de, no trabalho
vicentino que então ensaiava os primeiros passos, procurar imitar as virtudes da
Virgem Mãe de Deus. E vemos logo que os primeiros confrades procuraram
seguir o exemplo de sua Padroeira. Comprova-o a significativa passagem do
Manual (Introdução, pg. 10-11), ao referir-se aos primórdios do novo sodalício:
"Sabia-se, apenas que a esmola é imperioso dever para os cristãos, e que, se
eles deixassem de ser misericordiosos, ficariam fora do Evangelho; também
se sabia que, quando se cumpre o preceito da caridade, confiando a mãos inteligentes a distribuição das esmolas, são concedidas graças especiais a
esta distribuição; rememoravam-se as exortações de Jesus Cristo a seus
discípulos para que assistissem aos que sofrem, visitassem os doentes e
consolassem os aflitos; e, pondo de lado, radicalmente, qualquer preocupação de ordem
política, só se almejava absoluta conformação com as exortações, para ter
direito as recompensas prometidas por Nosso Senhor. Isto era tudo o que
procurava, tudo o que se pretendia; e assim foi durante muito tempo. "Se o
sucesso mais tarde veio ultrapassar nossas esperanças, se a confiança pública
veio aumentar um pouco o nosso tesouro, a princípio tão escasso, o nosso
espírito fundamental, não obstante, manteve-se intato, e, antes de mais nada, fez
de nós uma associação de cristãos, querendo ajudar os pobres, para
conquistar os méritos atribuídos a estas obras pias, e desejosos de aliviar a
miséria para por sua castidade sob a proteção da caridade ... " como viria
dizer mais tarde o grande LACORDAIRE.
Eis o princípio que animava os primeiros confrades e que
constituiu em todos os tempos o ponto fundamental da atividade vicentina.
A primeira tarefa que se impunha, por assim dizer, era imitar a pureza da
Virgem Imaculada, fazendo com que, por via do apostolado da caridade, os
jovens vicentinos pudessem proteger sua castidade.
E não poderia ter sido outro o sentido da proposição de
OZANAM! Inquieto com a onda de corrupção que lavrava em todos os setores da
sociedade de seu tempo, especialmente no meio acadêmico que frequentava,
refugiou-se sob o manto protetor de Maria Imaculada. E com o desenvolvimento
e o progresso de seu fecundo apostolado, cada vez mais fez penetrar o
espírito, a devoção à Nossa Senhora em sua querida Sociedade Vicentina.
Mais tarde, depois que conquistou a cátedra na Sorbona,
durante sua viagem pelo país do Cid, teria oportunidade de entoar um
hino magnífico à sua Virgem Maria. Ao passar por Burgos, detém-se diante da
famosa catedral e diz:
"O Nossa Senhora de Burgos, que sois também
Nossa Senhora de Pisa e de Milão, Nossa Senhora de Colônia e de Paris, de
Amiens e de Chartres, rainha de todas as grandes cidades católicas, sim
verdadeiramente, "vós sois bela e graciosa", Pulchra es et decora, já que o
vosso pensamento apenas impregnou de graça e beleza essas obras dos homens. Os
bárbaros haviam saído de suas florestas e esses incendiários de cidades
pareciam feitos apenas para destruir. Vós os tornastes tão submissos que curvaram a
cabeça sob as pedras, que se atrelaram às carroças pesadamente carregadas, que
obedeceram aos patrões para vos construir igrejas. Vós os tornastes tão
pacientes que não contaram os séculos para vos cinzelar soberbos pórticos,
galerias e flechas. Vós os tornastes tão ousados que a altura de suas basílicas
deixou longe os mais ambiciosos edifícios dos Romanos e ao mesmo tempo tão
castos, que essas grandes criações arquitetônicas com sua multidão de estátuas
não respiram senão a pureza e o amor imaterial. Vencestes o orgulho
desses Castelhanos que aborreciam o trabalho como imagem da servidão;
desarmastes um grande número de mãos que não achavam a glória senão no sangue
derramado; em vez de uma espada, destes-lhe uma trua e um cinzel e os
retivestes durante trezentos anos nas vossas oficinas pacíficas. Ó Nossa
Senhora! como Deus recompensou a humildade de sua serva! e em paga dessa pobre
casa de Nazaré onde abrigastes seu Filho, que ricas moradas vos deu"!
Esse hino magnífico à Nossa Senhora comprova, evidentemente,
a grande devoção e o imenso amor de OZANAM pela Mãe de Deus! Não é de
admirar, pois, que logo no início de suas atividades vicentinas quereria ele transfundir no novo organismo essa devoção que lhe era tão cara. E assim
foi, a tradição mariana acha-se intimamente unida à vida vicentina.
Poderíamos dizer, sem receio de erro, que uma das condições para a perseverança do
confrade na sua Conferência é a sua devoção à Nossa Senhora, cujas virtudes ele deverá procurar imitar no seu apostolado de caridade.
Cfd. Paulo Sawaya
Artigo publicado na Circular Periódica do Conselho Metropolitano de São Paulo, por ocasião do 1º CENTENÁRIO DA PROCLAMAÇÃO DO DOGMA DA IMACULADA CONCEIÇÃO!
1854 - 1954
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