1º DOMNGO DO ADVENTO

Marcos 13,33 – 37

Ficai de sobreaviso, vigiai; porque não sabeis quando será o tempo. Será como um homem que, partindo de uma viagem, deixa a sua casa e delega sua autoridade aos seus servos, indicando o trabalho de cada um, e manda ao porteiro que vigie. Vigiai, pois, visto que não sabeis quando o senhor da casa voltará, se à tarde, se à meia-noite, se ao cantar do galo, se pela manhã, para que vindo de repente, não vos encontre dormindo. O que vos digo, digo a todos: vigiai!

Comentário

Já é hora de acordar! Eis o apelo de Jesus no Evangelho que inaugura este tempo do Advento. Uma nova aurora surge no horizonte da humanidade, trazendo a esperança de um novo tempo de um mundo renovado pela força do Evangelho. Neste tempo de graça, somos convocados a sair do torpor de uma prática religiosa inócua, a acordar do sono dos nossos projetos pessoais vazios e egoístas. Despertos e vigilantes, somos convidados a abraçar o projeto de Deus que vem ao nosso encontro, na espera fecunda do Tempo do Advento, temos a chance de reanimarmos em nós e os compromissos assumidos em favor da construção do Reino, reavivando as forças adormecidas, para a construção de uma humanidade nova, livre das trevas do sofrimento, da marginalização e da morte.

Frei Sandro Roberto da Costa, OFM - Petrópolis/RJ

2º DOMINGO DO ADVENTO

Marcos 1,1 – 8

Conforme está escrito no Profeta Isaias: Eis que envio meu anjo diante de ti: Ele preparará teu caminho. Uma voz clama no deserto: Traçai o caminho do Senhor, aplainai suas veredas (Mt 3,1); Is 40,3). João Batista apareceu no deserto e pregava um batismo de conversão para a remissão dos pecados. E saiam para ir ter com ele toda a Judéia, toda Jerusalém, confessando os seus pecados. João andava vestido de pelo de carneiro e trazia um cinto de couro em volta dos rins, e alimentava-se de gafanhotos e mel Sivestre. Ele pôs-se a proclamar: “depois de mim vem outro mais poderoso do que eu, ante o qual não sou digno de me prostrar para desatar-lhe a correia do calçado. Eu vos batizei com água; ele, porém, vos batizará no Espírito Santo”.

Comentário

“Preparai o caminho do Senhor, aplainai as suas veredas”. Clamando pelo deserto, João Batista nos indica que procurar viver conforme a Boa-Nova que Jesus nos trouxe não se trata, simplesmente, de viver dentro de um sistema religioso com certas práticas que nos identificam com tais. Talvez ele queira nos indicar que a fé, antes de tudo é um percurso, uma caminhada, onde podemos encontrar momentos fáceis e difíceis, dúvidas e interrogações, avanços e retrocessos, entusiasmo e disposição, mas também cansaço e fadiga. No entanto, o mais importante é que nunca deixemos de caminhar, pois o caminho se faz caminhando. Boa caminhada de Advento e preparação!

Frei Diego Atalino de Melo

terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

3. FREDERICO OZANAM E A MISSÃO NA IMPRENSA




FREDERICO OZANAM
E A MISSÃO NA IMPRENSA


Ao falarmos de Frederico OZANAM e sua atuação na imprensa em sua época, é sempre bom esclarecer ou lembrar o panorama histórico, a situação da França em 1830, onde a política fervia com seus adeptos empenhados em uma série variada de lutas e ataques contra o regime de Luiz Felipe(¹). A semente do liberalismo(²) plantadas em terra fértil por mãos criminosas visava principalmente perseguir a Igreja, em nome da liberdade, enfraquecendo o seu poder e seu líder máximo: o Papa. Como havia dito Voltaire(³) era necessário "estrangular a infame".

                Por outro lado, o desregramento dos costumes, o gosto literário e científico da época se perverte e degenera no meio de tanta futilidade. Rebelam-se contra Deus e a Igreja, sonhando com a destruição das bases da religião, sendo que no ensino oficial predomina a preocupação, tendenciosa, de aniquilar Deus. Não se deve estranhar se a situação é desoladora e que a família se desmorona e a juventude seja incrédula.

                A Universidade de Sorbone(4), fundada pelo cristianismo em 1250, é o templo de ciência a serviço da deusa razão.

                É nesse quadro desolador que vamos encontrar Frederico Ozanam, disposto a lutar com todos aqueles que se insurgem contra a Igreja, seus dogmas e seus membros, com as armas que dispõe: sua cultura unida à uma inteligência esclarecida, habilidade de argumentação, fé viva e inabalável e, de uma grandeza moral a toda prova.

             Foi providencial para a história do catolicismo francês a chegada de Frederico Ozanam em Paris, onde soube utilizar com maestria a cátedra onde lecionava e os encontros literários, as Conferências de História e outras oportunidades que surgiam. Utilizou de modo expressivo os recursos de comunicação existentes, inclusive a imprensa, como meio de expor e transmitir suas idéias e, também, como meio de evangelização.

         Acentuamos em artigo da edição anterior como Frederico Ozanam, quando ainda morava em Lyon, utilizando-se do periódico intitulado "L'Abeille Française",  publicou um artigo sobre o tráfico negreiro e combateu o São Simonismo; esse artigo versava sobre a refutação desta doutrina, também escreveu no jornal o "Precursor" sobre o mesmo tema. Artigos de grande repercussão o introduziram no mundo das letras. Os artigos publicados em um volume foram elogiados por Chateaubriand e Lamartine.

                Em 1830 o professor de filosofia Manoel José Bailly trabalhava com afinco para reanimar a fé religiosa na França. Com o surgimento de nova onda de descristianização promovida pela reação dos adeptos do filósofo Voltaire, fundou o periódico "La Tribune Catholique". Em 1833 esse jornal fundiu-se ao periódico do abade Migne, cujo nome era "L'Univers Religieux". Dessa fusão nasceu o diário católico mais famoso do século XIX. Teve seu auge por volta de 1839 quando esteve sob a direção do talentoso escritor, convertido ao catolicismo, Luis Veuillot.

               Frederico OZANAM foi um dos primeiros redatores de "L'Univers". Em outra ocasião, assim escreveu Frederico Ozanam na "A Tribuna Católica": "Quanto mais a ciência tem avançado e feitos novos descobrimentos, mais ela aproximou-se da Revelação, à semelhança de um rio imenso que se aproxima do mar".

                BAILLY dirigia uma antiga agremiação denominada Conferência de Bons Estudos, a qual passou a ser frequentada por Frederico Ozanam. Em 1832 passou a chamar-se "Conferências de História"; BAILLY era o presidente e convidou Frederico Ozanam e outros jovens "amantes do estudo e da verdade" a fazer parte dela. Convencionou-se que BAILLY cederia o salão para as reuniões e dirigiria as sessões e, Frederico Ozanam como vice-presidente teria a incumbência de conseguir conferencistas e participantes. Em 1/12/1832 iniciaram-se os trabalhos e depois de muita luta e empenho viram seus esforços coroado de êxito. Era crescente o número de estudantes que frequentavam com assiduidade as Conferências de História, pois se tornaram conhecidas e comentadas, durante o período que durou: um ano. 

             O grande momento histórico deu-se quando do debate entre Frederico Ozanam e Juan Broet. Aconteceu quando naquele dia o tema escolhido era sobre a fé atuante. Broet, o jovem são-simoniano tinha fama de ser muito bem preparado e inteligente. Solicita a palavra e frontalmente ataca os militantes católicos: "A fé de vocês está nos livros, não nas obras; que fazem vocês para ajudar os pobres, os deserdados? No passado a Igreja realizou maravilhas, mas atualmente, o que faz pelo gênero humano? E vocês que se orgulham de ser católicos, provem que o cristianismo vive, não com eloquentes discursos, mas com obras sociais e, então acreditaremos em vocês"(5) E, segue Broet com voz pausada e potente expondo durante meia hora as teorias são-simonianas e como o cristianismo estava morto.

         Ao fim do longo debate, após a saída de Broet, os partidários de Frederico Ozanam se levantam, o cercam e felicitam. Mas ele sente-se cansado, pensativo e preocupado com tudo o que acaba de ouvir. Le Taillandier se aproxima com  Devaux e lhe diz: "Nossos debates são batalhas de palavras; você falou bem Frederico, mas é hora de passar aos atos, você não pensa assim?". "Você tem razão, afirma Frederico Ozanam. É preciso que permaneçamos juntos. Pois o que mais agrada a Deus é IR AOS POBRES, como fazia Jesus quando pregava o Evangelho. VAMOS AOS POBRES, para agradar a Deus e para que a caridade seja um meio de santificação".(6) Dias depois, no dia de seu aniversário, ao completar 20 anos, Frederico Ozanam,  junto com  os companheiros José Manuel Bailly, Francisco Lallier, Augusto Le Tailandier, Julio Devaux, Paulo Lamache e Felix Clavé, fundam a Conferência de Caridade, que, pouco tempo depois, passou a chamar-se Sociedade de São Vicente de Paulo.

               Frederico Ozanam no seu tempo de estudante vira com tristeza tantos jovens como ele, longe do lar, "pobres aves de arribação sobre as quais paira o abutre do pensamento, a incredulidade". Pensou então em criar um centro onde os jovens cristãos pudessem exercerem sólidos laços de amizade e a prática da caridade aos pobres.

                   As Conferências de Caridade fundada sob as bênçãos de um Patrono celestial como São Vicente de Paulo, o atleta da caridade do século XVII, e sob a proteção da Imaculada Virgem Maria, iriam assegurar a perseverança dos jovens e ao mesmo tempo, dar testemunho da vitalidade benéfica da Igreja Católica.

                Desde sua chegada a Paris, Frederico Ozanam ambicionou cátedras, que no seu dizer, "servissem aos seus jovens amigos como meio para se elevarem e, ao mesmo tempo, se instruir". Para isso dedicou grande parte da sua vida, pois tinha como sacerdócio o ensino.

                Pretendendo doutorar-se em letras, Frederico Ozanam elaborou o trabalho sobre “Dante e a Filosofia Cristã no Século XIII”. Fascinado pelo poema sagrado que o autor intitulou Comédia e os pósteros chamaram Divina, traça o caráter do poeta, estudando-o na sua vida e na sua obra.

                Frederico Ozanam, refutando opinião segundo a qual Dante era considerado um adversário da Igreja, afirma sua ortodoxia e prova a sua submissão ao papado. Concluído o trabalho, Frederico Ozanam, envia-o a Lallier, encarregando-o de introduzi-lo na Sorbone. A apreciação da tese se fez em 7 de janeiro de 1839. Era dedicada a Lamartine, a Ampère filho e ao Padre Noirot.

               Frederico Ozanam se apresenta ao exame e responde a todos os quesitos. Mas, o êxito é a tese sobre Dante. Cousin, entusiasmado com a prova, exclama: “Senhor Ozanam, não se pode ser mais eloquente”. À coroar a exposição, Frederico Ozanam declara francamente: Não tenho a grande alma de Dante, mas tenho a sua fé”. Reboara na sala uma fragorosa ovação. Conquistara Frederico Ozanam o diploma de doutor em letras. Diz o biografo Carranza “que não se tinha memória de um exame tão brilhante”.
                "Na Sorbone, diz Guillemin(7),  deu Frederico Ozanam exemplo de um método de rigorosa investigação, cujo princípio fundamental consistia em não se divulgar senão o que fosse estritamente verificado".

                 Em 1834, publicou os artigos sobre os cursos ministrados na Sorbone pelo padre Frère. No "Universo Religioso" publicou diversos artigos comentando as grandes festas religiosas, sobressaindo o artigo sobre a Anunciação e a devoção à Nossa Senhora, e destacando sua influência nas belas artes.
                Em colaboração com Lallier refutou um curso de Lerminier, desenvolvendo o tema que, devido a certas investidas, o ensino da história religiosa deveria ser incrementado e mais largamente difundido entre os jovens. Ainda em colaboração com Lallier, traduziu poesias do escritor italiano Silvio Pellico, homem de grande religiosidade e em cujo epitáfio se escreveu "Sob o peso da Cruz aprendeu o caminho do Céu".

                    Em 1834 publicou no jornal "França Católica" o início de uma série de estudos, com a finalidade de esclarecer e ao mesmo tempo ser um ato de acusação do catolicismo contra o romantismo, que definiu como "literatura egoísta e sensual, a qual se proclama inspirada e, entretanto, ostenta sobre os altares do belo e do sublime a imagem do horror e do extraordinário".

                 Em seu tempo soube Frederico Ozanam utilizar os meios e recursos que imprensa oferecia, em defesa da Igreja, de fidelidade a Cristo e em favor dos jovens que tanto amou e influenciou. Ainda, colaborou e publicou artigos nos periódicos "O Contemporâneo", "Amigo da Religião", "Correspondente", "Anais da Propagação da Fé", "Novo Correspondente", "Monitor Religioso" e "Revista Européia".

                  Ouçam os jovens, principalmente os universitários o seu apelo, ainda vibrante após mais de um século e meio e, os ensinamentos de Cristo proclamados por um dos seus discípulos mais fiel: ANTÔNIO FREDERICO OZANAM.
                                                                          

                                                                           Mário Maríngulo

Notas:
  1. Luís Filipe I, Filho de Filipe e de Luíza de Bourbon, rei dos Franceses de 1830 a 1848. Estabeleceu a monarquia liberal.
  2. Liberalismo: O conjunto de idéias e doutrinas que visam assegurar a liberdade individual no campo da política, da moral, da religião, etc. dentro da sociedade. (Aurélio).
  3. Voltaire: poeta e prosador francês (1694-1778). Cultivou todos os gêneros. A sua influência literária e social foi enorme. É o escritor francês por excelência.
  4. Sorbone:fundada em 1250 pelo Pe. Roberto de Sorbón, capelão e confessor de são Luís, Rei da França, é o colégio mais antigo da Universidade de Paris.
  5. Carranza: "Ozanam e seus contemporâneos", pág. 138 e seguintes.
  6. Carranza: "Ozanam e seus contemporâneos", pág. 138 e seguintes.
Jornais e publicações onde colaborou
"A Abelha"e o "Precursor" de Lião - " O Contemporâneo", "Amigo da Religião", "Correspondente", "Anais da Propagação da Fé", "Nova Era", "Novo Correspondente", "Universo Religioso", "Tribuna Católica", "Monitor Religioso", "Revista Européia"
        














sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

7. UMA ESPIRITUALIDADE VIVA PARA OS VICENTINOS DE HOJE


















UMA ESPIRITUALIDADE VIVA PARA OS VICENTINOS DE HOJE

              
               Os tempos mudaram e com eles houve necessidade de transformação do homem moderno em não poucos setores da vida. A Sociedade de São Vicente de Paulo (SSVP) não poderia constituir exceção.

               Na Assembleia Europeia da SSVP, efetuada em Lisboa em 1976, no primeiro subtema das apresentações diz o relator: “Não só se houve, mas também se constata que a SSVP atravessa uma grave crise que, por certo, não é mais do que o reflexo da crise da própria Igreja e do mundo atual, onde os conflitos se multiplicam e, até, deparamos com o espetáculo de confrontos em que o pretexto religioso é evocado como causa e efeito”.

               E acrescenta: A SSVP é acusada, muitas vezes pelos próprios confrades e consocias, de ser rotineira e tradicionalista e, por isso, de não ser capaz de detectar alguns dos importantes problemas da miséria do nosso tempo. Muitas vezes “remedeia-se” uma situação sem a preocupação de reivindicar a justiça apropriada para os que sofrem. São muitas as formas de pobreza, indo elas desde os que sofrem nos cárceres sem ouvirem uma palavra de simpatia, aos velhos isolados que não encontra quem os compreenda e com eles dialogue: é o problema do racismo e das guerras do Líbano e da Irlanda, dos confrontos entre israelitas, palestinos e árabes, etc. e que uma atitude ecumênica de real inspiração ajuda a encontrar a solução de justiça paras as vítimas inocentes. São também de não esquecer os cancros sociais que resultam do uso e abuso da droga e do álcool, da prostituição e da sexualidade para a qual até, por vezes, se encontram argumentos em termos de libertação do corpo; é a tristeza das mulheres abandonadas e a multidão dos que não têm meios para ter uma casa onde possa desenvolver uma vida familiar condigna. São ainda os doentes sem assistência espiritual”.

               Eis aí uma série de importantíssimas questões que o relator expôs aos numerosos confrades reunidos em Lisboa, lembrando-lhes que sobre as mesmas a SSVP tem de refletir.

               Deste lado do Atlântico a situação, se não é a mesma, será talvez ainda pior. E particularmente em nosso país, dada sua enorme extensão, os problemas se apresentam mais graves, demandando soluções urgentes uns, atenção permanente outros, e, não raro, declaração de estado de emergência. É o que acontece também com a nossa SSVP, que participa da referida crise, a nosso ver, não tanto em decorrência de uma situação mundial quase caótica, como pelas distorções dos princípios que desde 1833 a nortearam.

               Pouco a pouco, tais distorções foram levando os confrades e consocias à vida rotineira. Sem perda da religião, foram se habituando a uma simples distribuição de vales aos necessitados, hoje superada.

               Nossos confrades e consocias amam os necessitados, mas não amam tanto seus próprios companheiros – os confrades de sua Conferência. Distinguem-se, assim imperceptivelmente, diversas qualidades de “próximos”: os que recebem auxílios e as atenções da Conferência Vicentina, os que se acotovelam uma vez por semana nos bancos rústicos de uma pequena sala na Igreja paroquial e conversam sobre os chamados “pobres”; os que arcam, não raro isoladamente, com as tremendas responsabilidades da direção de nossa Sociedade, etc. E, no entanto, nos Santos Evangelhos, não encontramos a palavra “próximos”, mas simplesmente o nosso “próximo”. Não há distinção para a distribuição de nosso amor. O texto é claro: “Amar ao próximo como a si mesmo...”, seja ele o necessitado, o confrade, a consocia, o presidente da Conferência, do Conselho e outros.

               Dessa distinção resulta uma atitude do confrade ou consocia que deverá ser corrigida, para podermos corrigir as distorções do apostolado vicentino. Deveremos começar em nossa casa...

              Qual o confrade ou consocia que um dia se preocupou seriamente com seu companheiro com o qual participa da reunião da Conferência? Em que momento ele perguntou ao seu irmão de apostolado da caridade: meu amigo, sei de algo que o atribula, poderei auxiliá-lo? Não está necessitando de um conselho, de uma palavra de conforto, de uma orientação? O que o aflige? Poderei minorar seu sofrimento? Será esta a causa de sua pouca frequência às reuniões da Conferência? E com os socorridos, qual o confrade ou consocia que se dispôs a cuidar, ao menos por uma semana durante o ano, dos filhos de seu socorrido, para que os pais pudessem respirar os ares do campo, usufruindo de umas pequenas férias tão desejadas e necessárias?

                A legislação trabalhista dispõe que todos os assalariados têm o direito a 30 dias de férias por ano. Que adiantarão esses 30 dias se o empregado  não possui meios para gozar essas almejadas férias? A maioria irá utilizar os 30 dias para conseguir mais recursos, para, pelo menos, pagar as dívidas. E se os confrades e consocias, numa reunião da Conferência, estudassem esses problemas e se dispusessem a auxiliar seus socorridos de tal modo a poderem ter um descanso de 30 dias?  Há mil maneiras de solucionar questão tão simples! 

              Mas a reunião da Conferência está marcada com a rotina de todas as semanas e não há tempo para discutir os problemas dos socorridos. É necessária uma alteração radical nos hábitos que temos tão arraigados. Ainda não há muito, o Conselho Geral recomendava a todos os confrades e consocias a meditação sobre o significado real da visita vicentina. Não deve ser rotineira, apenas distribuição de vales, mas tem de ser uma visita amiga, amiga no mais amplo sentido da amizade. Não vamos nós vicentinos fazer a visita a um socorrido, mas a uma família de nossa amizade à qual desejamos dispensar assistência, quase sempre para reparar as injustiças de que ela é vítima. E, assim, teremos satisfeitos os desejos de promover a família que passará a ser realmente a nossa família. Tudo faremos para que isto aconteça no mais breve espaço de tempo possível.

                 Naturalmente, esta atitude demanda uma série de providências que teremos de tomar em consonância com a opinião de nossos irmãos com os quais nos reunimos todas as semanas. Poderão ela dar, também, seu valioso auxílio para a obtenção dos recursos indispensáveis, para que consigamos nosso desiderato. É óbvio que, em uma reunião em que tais atividades sejam discutidas, não será uma reunião morna, mas quente. Cada um terá de dar seu palpite; as opiniões agitarão as reuniões, as providências serão devidamente discutidas e as soluções para os problemas propostos serão encontradas. Assim faziam os primeiros confrades. Lamentavelmente, não se manteve em muitas Conferências essa atitude. Pouco a pouco nos habituamos ao “tudo está em ordem”, “não há novidades”, “não vale a pena modificar”, “não adianta tentar uma outra solução”. Reduzimos nossos desejos, talvez, para abreviar uma reunião que então se tornará fria, enfadonha, e, porque não dizê-lo, insuportável. Para que tais atitudes se efetivem, elas não se referem apenas aos membros de uma Conferência, independente de cor, sexo, idade ou posição social.

               Naturalmente, todos os amigos de OZANAM que aderiram às primeiras Conferências Vicentinas eram jovens. E eles passaram a adultos e alcançaram, muitos, a chamada idade provecta, isto é, avançada em anos. E sobreviveram mantendo sempre aceso o fogo sagrado do ideal vicentino que é a santificação do próximo, sendo o primeiro próximo ele mesmo. Depois vêm seus companheiros e depois os socorridos. Engano pensar que a SSVP foi fundada para socorrer os pobres! Já o disse BAILLY e muitos confrades o repetiram.

          Vale aqui um reparo. Muito antes de OZANAM admitir os necessitados nas Conferências, já aliciava os jovens para trabalharem na defesa da Santa Igreja.

               A SSVP atende a todos, principalmente a jovens e adultos. É preciso atentar, porém, que somos nós, nos os vicentinos que não dispensamos nossa querida Sociedade. Puro engano, que acontece não raro com os jovens, pensarem que somos imprescindíveis. Que se não houver jovens a SSVP perecerá. Os jovens bem intencionados, naturalmente, procurarão a SSVP atendendo às suas finalidades principais. Os que não concordarem com seus regulamentos, suas regras, seriam melhor que não viessem.

               Os tempos mudaram. É certo. E acreditamos que mudaram para melhor. Conseguimos erradicar muitos erros e aperfeiçoar muitas virtudes. Haja vista o apostolado extraordinário que humildes confrades desenvolvem por este Brasil afora. Nosso Presidente Gral comoveu-se até as lágrimas quando viu aquela velhinha percorrer 80 horas de ônibus para vir assistir à reunião de Brasília por ele presidida.
        
               Devemos compreender que os tempos são outros e outros devem ser nossos hábitos. Por isso, é indispensável nossa compreensão e nossa colaboração, principalmente, mantendo viva aquela espiritualidade que transcende de uma visita a um socorrido, seja ele confrade ou um necessitado. Quando fazemos nossa visita, devemos dar-lhe um caráter especial de espiritualidade pois com ela iremos entrar em contato com o próprio Cristo.

                A unção que temos ao nos aproximarmos da mesa Eucarística, deve ser a mesma quando nos aproximamos de nosso socorrido. Quando na penumbra de uma capela, diante do Santíssimo Sacramento, fazemos na calma daquele ambiente, nossa meditação, conversamos com Deus Nosso Senhor, expomos-lhe nossos sofrimentos, nossas dúvidas, nossas angústias, mas, também, nossas esperanças, nossas alegrias, nossos desejos mais doces. Assim, quando entramos em contato com nosso socorrido, no leito de um hospital ou no porão escuro ou, ainda, num casebre humilde ou através das grades de um cárcere, vamos conversar calmamente com ele, nos daremos completamente a ele, e iremos perguntar-lhe de que necessita e o que poderemos fazer por ele, e dali sairemos certamente confortados com seu magnífico exemplo de humildade, de resignação, de paciência, de fé e de esperança.

              E assim, nesses extraordinários momentos, certamente, seremos
mais de Deus. O Cristo sofredor que visitamos a ele damos a mão e infundimos-lhe esperança e confiança no futuro que lhe parecia tão escuro.             

              Mas, nossa intenção aqui é apresentar o que tão oportunamente nos informa o  relator  deste  tema. Voltemos,  portanto,  ao  relatório  da Assembléia européia.

               “O desenvolvimento científico e técnico vertiginoso, diz, não foi acompanhado socialmente por formas de vida em que o social se desenvolve dentro dos princípios morais e de justiça adaptados às rápidas mudanças. No entanto, muita gente luta por uma sociedade mais justa e, com esse fim, multiplicam-se instituições internacionais que resolvem questões pontuais, mas não o sistema essencial. O homem luta pelo refrigerador, pela televisão, pelo automóvel e esforça-se, numa competição desenfreada por alcançar os lugares a que se julga com direito sem que a palavra fraternidade, tantas vezes dita pelos políticos, seja sentida”

               É óbvio que não poderemos desprezar todos estes elementos que existem como resultado do próprio esforço humano. O que falta vem a ser justamente essa fraternidade que se nos apresenta cada vez mais enfraquecida.  E prossegue o relator:

               “A Igreja e a SSVP que é parte da Igreja, são abaladas por todos estes acontecimentos e o Concílio Vaticano II e as Assembleias Vicentinas foram altos momentos de autoanálise em que surgiram propostas e sugestões de formas de melhor e mais atual vivência cristã. No entanto, depois destas reuniões a vida continua e, infelizmente para muitos, como antes. Ficou-se nas palavras, faltaram os atos”.

               Foi exatamente o que sentiram os jovens que se reuniram na 9ª. Jornada da Juventude Vicentina do Estado de São Paulo no Mosteiro de Cister em Claraval*, em 1977.

               Unânime a opinião de haver em todas as Jornadas, muitos discursos, muitos relatórios, muitíssimas propostas... Mas, reduzido número de fatos concretos, de realizações, enfim, escassas as promoções dos socorridos e dos próprios Confrades. Naquela Jornada pairava no ambiente uma atmosfera de expectativa.

               Vêm a propósito, com muita justeza as palavras do relator da Assembleia Europeia:

               “Apetece aqui recordar que, em 1833, FREDERICO OZANAM e os seus amigos tiveram a inspiração de se unirem para o serviço dos pobres de maneira mais humilde e discreta, no enquadramento da sua vida profissional e familiar de leigos que sentiam o dever de dar testemunho da sua fé mais por atos do que por palavras, vendo em todos os que sofriam o Cristo sofredor. Pelo seu contato pessoal com os “pobres” sentiam que a Caridade é inseparável das exigências da justiça. Por isso reivindicavam justiça para os “Pobres”. Dialogavam com os “Pobres” e, deste modo, sabiam também ser “Pobres”. E foi assim que exigiram para si um, cada vez maior, aprofundamento espiritual para um contato espiritual mais esclarecido do que é a verdadeira essência da SSVP, de pessoa a pessoa”.

               Esse contato de pessoa a pessoa nunca é demais insistir, foi o fator principal da atividade apostólica vicentina desde o início de nossa Sociedade. E bem podemos avaliar as consequência dessa atitude dos primeiros confrades. Solidarizaram-se confrades e socorridos, fortaleceu-se uma amizade que constitui marcante característica da SSVP.

               Muita expressiva a abalizada opinião do relator que assim a expõe:
               “Sem esgotar todas as nossas necessidades, julgamos poder dizer: 

        1.  É preciso renovar no respeito ao que de essencial nos vem das origens da nossa Sociedade sem cairmos na tentação de nos acomodarmos à nossa época.  Como? Sabendo ser fiéis à nossa própria vocação.

        2.   Na Sociedade em que o secularismo e pragmatismo reina, com o ritmo da vida que levamos, a vida da nossa Conferência ressente-se: faltam os membros, dá-se a maior importância a aspectos secundários, vendo-se muito no aspecto econômico a razão de sobrevivência das Conferências. Entretanto, a mensagem que nos é transmitida pela “visita” passa quase despercebida.

       3.  No entanto a SSVP surge, como dizia OZANAM, porque “sentíamos o desejo e a necessidade de  manter a nossa fé no meio das acometidas operadas pelos diferentes tipos de falsos profetas. Façamos algo que esteja de acordo com a nossa fé e apesar disso, as obras de caridade continuam a faltar. Contribuamos, como Deus nos disse, para formar uma grande família de irmãos:

  • Mantendo e esclarecendo a nossa fé na nossa Conferência, expandindo-a e compartilhando-a com as comunidades em que estamos inseridos;
  • Cumprindo escrupulosamente a nossa Regra, sobretudo, no essencial que é a visita e o comparecimento semanal à reunião da Conferência, sendo capaz de extrapolar para a nossa vida a mensagem aí recebida;
  • Tendo a originalidade de saber construir as obras de caridade  do nosso tempo.”  

               Todas essas recomendações tão salutares, se bem observadas, conduzirão, necessariamente, a um maior progresso do apostolado vicentino.

               Todavia, esse apostolado depende de intensa vida espiritual. É o que nos informa a respeito o digno relator:
               “Como praticar uma espiritualidade mais viva para o nosso tempo?”
               a)  como princípio básico de todo o cristão, em união íntima com Cristo, de acordo com o que disse o Senhor “O que permanece em Mim, como Eu nele, esse dá muito fruto, porque sem Mim, nada podeis fazer”. (João, 15,5).

               A personalidade do vicentino deve ser informada por esse valor fundamental que lhe dá sentido à vida. Deste modo nele se põe constantemente a exigência de:
·      Conhecer melhor a Cristo
·      Amá-lo melhor
·      E, como consequência, comunicá-lo com mais vida e difundi-lo à todos.

            b) Este princípio básico para  manter-se atuante deve ser alimentado de diferente formas:

                   b.1 – Pela sagrada liturgia que é o cume para que tende toda a atividade da Igreja e força de onde emana a sua força. A sua participação ativa realiza-se:

            - nos sacramentos da Penitência e da Eucaristia pelos quais somos conduzidos à Comunhão com e entre todos os nossos irmãos;

            - no Ofício Divino que é a verdadeira oração litúrgica, sobre o qual o Concílio Vaticano II recomenda “que os leigos rezem o Ofício Divino ou com os sacerdotes, ou reunidos entre si ou, inclusive, em particular”.

        A nossa reunião da Conferência desenvolve-se de forma semelhante à estrutura da oração litúrgica: oração inicial, leitura espiritual, informações sobre as visitas com os pedidos das necessidades, coleta e oração final.

               Não poderíamos revitalizar a reunião com uma oração litúrgica o que,  certamente, nos levaria a viver mais “em Igreja” e “com a Igreja”? 

         Sugere-se que isto poderia ser feito como:
         - A recitação dos Salmos (a melhor expressão da alma do povo);

         - Leitura da Palavra de Deus, o que poderia provocar um confronto da nossa vida com ela e iluminar a ação caritativa;

       - A coleta como resposta a irmão e comunhão com Cristo, com o sentido da comunicação cristã dos bens materiais e das pessoas;

       - A comunhão de pobreza, pedindo ao Senhor pelas necessidades comunitárias;

          - Oração final.

              b.2 – Pela oração de que Cristo é modelo e que é um encontro de homem que procura Deus para o salvar. A sua necessidade é constante e, por isso, a Regra vicentina muito insiste em que ela seja praticada. Não esqueçamos que o “Pai Nosso” é não só o protótipo de oração mas uma contundente fórmula sobre o significado da nossa fé. Deste modo situa-nos:
           
            - perante Deus em atitude de esperança filial (filhos);
            - perante os homens em fraternidade (irmãos);
            - perante as coisas (pão) em atitude de recebimento e pobreza (cada dia);            
            - perante a história, como construtores do reino;
            - perante o pecado, em atitude libertadora, pessoal e social                        (ofensas, tentações, mal).

               c) Todas essas recomendações para serem válidas necessitam de prática assídua que abranja a vida toda do Confrade e da Consocia. Assim, acompanhamos o relator nas suas instruções:

            “A nossa espiritualidade deve ser alimentada pela prática das virtudes teologais, que nos leva a uma vida cada vez mais íntima, com Cristo e, decerto, nos vai fazendo transcender os sentimentos humanos de filantropismo”.

                  A primeira virtude – a Fé – não implica crer em “alguém” que é Cristo nas suas dimensões vertical e horizontal de que resulta uma atitude que é simultaneamente um “modo de ser" Cristo nos irmãos. Um “modo de ser” que leva a um desejo de reconversão permanente a Cristo e um “modo de fazer” de acordo com os valores evangélicos da forma como diz PIERRE CHOUARD: “Atestar a fé por um amor pessoal aos que sofrem” pois uma vocação que não se exprime por uma promessa, por um compromisso, é uma vocação sem afeto, uma vocação perdida”.

            A segunda virtude – a Esperança – implica do vicentino, aguardar pacientemente a hora de Deus, vivendo num esforço dinâmico pessoal de ser pobre para, progressivamente, transformar o mundo, libertando-o da escravidão da riqueza, na atitude de “não julga. Está disponível”.

                   A terceira virtude – a Caridade – a virtude que, como diz São Paulo “nunca acaba”. É a virtude eterna porque é o Verbo de Deus que revela que Deus é Amor. Segundo São Paulo “as profecias desaparecerão, as línguas cessarão e a ciência findará. Porque nossa ciência é imperfeita e a nossa profecia também é imperfeita. Mas quando vier o que é perfeito, o que é imperfeito será abolido”.

                  É claro que para atingir a plenitude dessa vivência apostólica é necessário que se tenha o que o relator chama “vocação do Amor. Acompanhemo-lo neste particular: “Neste sentido a sua espiritualidade deve, segundo a Regra, contribuir para:

       - fazer da Sociedade uma verdadeira família, humana e espiritual;
       - assegurar a unidade da Igreja;
       - testemunhar a sua fé por um amor pessoal aos que sofre de forma a acreditarmos que:

                        ▪ ”vivemos com Deus” quando amamos
                        ▪ “convivemos com Deus” quando nos amamos
                        ▪ o “dom” que nos é dado, o compartilhamos.

                        d) A forma da nossa espiritualidade deve assentar em  “carismas”, isto é, em dons especiais que Deus nós dá, a nós ou à comunidade em que trabalhamos, em função de uma missão ao serviço dos outros. De fato, sendo a SSVP uma organização de leigos que vivem e desempenham cargos no mundo, toda a espiritualidade que não reflita esta realidade, é falsa.

                        Como vicentinos recomenda a Igreja que “os leigos que seguem a sua vocação, que a tenham inscrito em alguma associação, se esforcem, igualmente, em assimilar com fidelidade as características peculiares da espiritualidade própria de tais associações”.

                       e) Não há vida espiritual sem vivência de “Espírito de pobreza” a qual é uma disposição interior, que deve levar o vicentino a viver pessoal e comunitariamente naquele espírito. Vivendo o mundo, os vicentinos devem estar atentos ao testemunho de Cristo e à sua realidade inerente:

              1° - Jesus encontra a sua segurança no Pai, na oração;

            2° - A partir dessa segurança sente-se livre perante a riqueza e não se faz escravo dela (Mt. 4,8-10), não utiliza o “poder” em benefício próprio (Mt. 4,4)., não opta por um messianismo fácil  (Jo. 6,15-26). A fidelidade leva-o, inclusive, à morte (Mt. 8, 19-20).

            3° - Vive para os outros. Vive com quem serve (II Cor. 8-9).
                       
                        Em coerência, a sua vida deve refletir esta realidade nas solicitações que o rodeiam:

                1° - Perante a mistificação do dinheiro e do poder dar um sentido aos bens, em função da pessoa e da fraternidade (função profética);

              2° - Ante a ânsia do domínio sobre “o outro” optar pelo homem, procurando-lhe uma situação mais humana e mais justa (função real);

                    3° - Libertando-se, inteiramente, de forma a por tudo o que “é” ao serviço dos outros. O vicentino não “dá”, “da-se”. Por isso, também, recebe e enriquece-se. O “espírito de partilha” de que se fala no preâmbulo da Regra, tem de ver com o espírito de reciprocidade e de serviço. É oblação (função sacerdotal).
                        
               Esta exposição clara indica-nos muito bem a dimensão da espiritualidade viva, que devemos manter como vicentinos dedicados ao apostolado da caridade. A tônica desta espiritualidade é, bem o compreendemos, a vivência de uma Caridade evangélica, como recomendaram desde o início os fundadores da Sociedade de São Vicente de Paulo.  

                    Mantendo bem viva esta espiritualidade nos aproximaremos por certo daquele modelo admirável invocado pelo próprio Cristo ao relatar a parábola do Bom Samaritano. E este não era Confrade e nem cristão, mas o doutor da lei indicou-o como o verdadeiro próximo, pois era o único que havia tido misericórdia  com o pobre ferido que jazia na estrada. Sejamos pois como o bom samaritano e assim conseguiremos mais facilmente manter bem viva nossa espiritualidade vicentina!

(* Palestra proferida na Reunião Interprovincial do Conselho Metropolitano de São Paulo em Maio de 1977),






6. A SSVP E O TESTEMUNHO DA FÉ ATRAVÉS DA CARIDADE













 Sociedade de São Vicente de Paulo  e  o  Testemunho da Fé  Através da Caridade (*)



A Sociedade de São Vicente de Paulo espalhou-se não só por todo o território brasileiro, como por todo o mundo. Existe em 148 países, e em cada um deles guarda característica própria, unindo-se a todos os demais, de modo que, em todos eles as Consocias e os Confrades Vicentinos procurarem atingir a finalidade principal da Sociedade, que vem a ser a sua santificação própria e a santificação dos socorridos.

               Características desta Sociedade são, portanto:

               a) A santificação da Consocia e do Confrade;

               b) O interesse em santificar o socorrido;

               c) A necessidade de promoção da pessoa do pobre.

a. Santificação da Consocia e do Confrade



A Consocia e o Confrade Vicentino tem OZANAM como modelo. Para se saber então como é a Consocia e o Confrade Vicentino e, qual o testemunho que ele deve dar, bastará ter presente como agiu ANTÔNIO FREDERICO OZANAM. 



É o próprio Cristo que nos ordena a modelar nosso amor para com nossos irmãos, nossa caridade fraterna pelo que nos testemunhou. Isto quer dizer que devemos amar-nos à sua maneira e segundo seu exemplo. 



Primeiro, Cristo nos amou prevenindo-nos, alertando-nos para que procuremos merecer seu amor. Se nossas virtudes e nosso amor não O atraíram, que foi pois que o atraiu para nós? Nossa miséria. É preciso compreender: Ele nos amou em grau superlativo, mau grado nossa miséria. 



O combate à miséria, nossa e do nosso próximo, deve ser a característica da Consocia e do Confrade Vicentino, que nessa luta não esquece que em tudo deve ter presente a caridade vicentina. 


Em que medida nossa caridade fraterna responde a este ideal e apresenta estes caracteres? 

Aos pobres devemos testemunhar um amor solicito não esperando que eles façam apelo a nós. Sabemos que eles não virão à nós por uma certa vergonha, pudor, timidez. É preciso ir procura-los. As consócias e Confrades devem sentir uma inquietação, uma angústia da miséria, uma necessidade de eliminar a miséria, onde ela se encontra, procura-la na medida de nossos meios, sem esperar que nos indique tal ou qual pobre. É preciso ter imaginação e engenhosidade para encontrar os meios. Porque, pelo exemplo do Cristo e de São Vicente, é o amor misericordioso que nos deve caracterizar. Na medida da intensidade desse amor daremos testemunho de nossa fé. 

Não importa saber se os socorridos são ou não responsáveis pela sua miséria. Se forem os responsáveis, é assunto que só a Deus pertence. Se, são desgraçados, bastará que nos demos a eles como amigos e irmãos. Não pediremos paga ou compensação. Como disse Jesus: “Recebestes gratuitamente, daí gratuitamente”. 

Se acontecer um ou outro pobre não se mostrar reconhecido, der má acolhida ao visitante ou permanecer indiferente, não deve a Consocia ou Confrade entristecer-se. Jesus saberá ser reconhecido em seu lugar. Por outro lado, qualquer que seja a atitude desses pobres, testemunha-lhes a Consocia ou Confrade o mesmo amor dedicado, cheio de bondade e doçura, para dar autêntico testemunho do Cristo, porque é a Ele que a Consocia ou Confrade vai indo ao pobre. Deve o Confrade ir aos pobres sem esperar recompensa. Sabendo que amar consiste em amar mais que ser amado, em dar mais que receber. (Lavocat). 

A miséria material cedeu à miséria espiritual, ao sofrimento moral. A re-introdução na sociedade de todos que dela foram excluídos por meio de uma formação espiritual profunda, procura de informantes, coordenação dos diversos movimentos caritativos, etc. 

Numa reunião vicentina alguém propôs a seguinte questão:

Como ser Consocia e Confrade em nossos dias?

          Quatro vias foram lembradas:

          1. A miséria continua não somente a subsistir, mas a ampliar-se.                     
           2. É preciso levar o remédio com competência e na linha do                         nosso tempo. 

           3. Como encontrar Deus em nossa época senão por uma                               abertura a todos os deserdados? 

           4. Temos um dever missionário: ir procurar e descobrir os que                     aderirão a nós e nos substituirão. 

Ainda aqui o exemplo de OZANAM dá-nos orientação segura. Quando se encontra em presença de um pobre que ele está visitando, OZANAM tem consciência de receber muito mais do que está dando, pois o espetáculo dessa miséria serve para torná-lo melhor. Sente então por esses infelizes tal sentimento de gratidão que não pode deixar de amá-los. Disse ele: “Oh! Quantas vezes eu próprio, oprimido por algum sofrimento interior, inquieto com minha saúde mal refeita, entrei cheio de tristeza na casa de um pobre confiado a meus cuidados e lá, diante de tantos infortúnios mais dignos de lástima do que eu, censurei a mim próprio o meu desânimo, senti-me mais forte contra a dor e agradeci a esse infeliz que me havia consolado e fortificado pelo espetáculo de suas próprias misérias. É como, portanto, não o teria eu amado mais ainda?”. 

b. O interesse em santificar o pobre
Deve-se distinguir o pobre do socorrido. Pobre somos todos nós. Quem de nós é auto-suficiente?  Quem de nós não precisa de alguma coisa? Quando falamos de pobres na vida vicentina, muitas vezes somos tentados a excluir-nos. Não foi essa a intenção de OZANAM, quando congregou seus companheiros da Sorbona para se unirem em defesa de sua fé. Como todos sabemos, na época em que OZANAM fundou a Sociedade de São Vicente de Paulo, dominava o agnosticismo, principalmente no meio universitário. A fé daqueles jovens perigava. E por isso OZANAM convocou-os para darem testemunho de sua fé pelas obras de Caridade. 

Pobres que eram, fatigados pelas discussões estéreis no meio acadêmico, buscaram um meio de testemunhar sua fé, e resolveram procurar os necessitados. Apareceram-lhes então os necessitados, i.é, os que se achavam ameaçados pela miséria, os que careciam de alguma coisa para sobreviver. OZANAM e seus companheiros não os conheciam. Valeram-se da Irmã Rosalia que os indicou e, assim, aprenderam a via segura da prática da caridade vicentina, e com isso, puderam contribuir para a santificação do socorrido. Caracterizou-se então a prática da caridade vicentina. Como se dizia naquele tempo, foi ao socorrido levar a esmola a qual no dizer de OZANAM é a retribuição dos serviços que não tem salário. O necessitado não é um ser inútil, pois todo homem que sofre serve  Deus e, por conseguinte, a sociedade, como aquele que reza. Realiza um ministério de expiação, um sacrifício cujos méritos recaem sobre todos. Recomendava OZANAM: “Não digais que, se considerarmos a miséria com um sacerdócio, queremos perpetuá-la: a mesma autoridade que nos anuncia que haverá sempre pobres entre nós, é também aquela que nos ordena tudo fazer para que não mais existam. Quando receais tanto prestar um serviço grande demais àquele que recebe a esmola, receio que não tenhais jamais experimentado que ela também presta um grande serviço àquele que a dá. Aqueles que conhecem o caminho da casa do pobre, jamais batem à porta sem um sentimento de respeito. Sabem que recebendo deles o pão, com ele recebe de Deus a luz, o necessitado os honra; sabem que podem pagar a entrada de teatros e festas públicas, mas que nada jamais pagará duas lágrimas de alegria nos olhos de uma pobre mãe, nem o aperto de mão de um homem honesto a quem se deu a possibilidade de voltar ao trabalho. Não existe crime maior do que tirar ao infeliz a gratidão, a última riqueza que lhe sobra, mas a maior de todas, pois nada existe que ela não possa pagar”. 

c. A necessidade de promoção da pessoa do pobre 

Para dar desempenho integral à sua missão, a Consocia e o Confrade  Vicentino, ao entrar na casa do socorrido, leva o desígnio firme de promover o seu reajuste, a sua reintegração à Sociedade de que foi afastado pela injustiça social. Neste particular, ainda de grande valia é o exemplo de OZANAM; durante toda sua vida, OZANAM se esforça por praticar e por fazer praticar essa bela virtude. Em um de seus artigos, dirigido às pessoas de bem ele escreve: “Resta-lhes um inimigo que não conheceis suficientemente, de quem não gostais que vos falem e sobre o qual resolvi hoje falar-vos: a miséria“. E mais além interpela os ricos desse mundo: “A previdência tem seus limites e Aquele que nos ensinou a pedir o pão de cada dia, jamais nos aconselhou a assegurarmos dez anos de luxo”. 

OZANAM ao verificar o desprezo pelos pobres pensa com efeito, que uma esmola feita com tais sentimentos só pode humilhar aquele que a recebe; pois distingue, com muita fineza, a assistência que humilha e aquela que honra. Ela humilha “se nada tem de recíproco, se apenas levais ao vosso irmão um pedaço de pão, uma roupa, um punhado de palha os quais, jamais, provavelmente, tereis de pedir a eles, se os colocais na situação dolorosa para um coração bem conformado de receber sem dar de volta; se, ao alimentar aqueles que sofrem, pareceis apenas preocupados de fazer calar esses gemidos que entristecem a grande cidade ou de conjurar os perigos que ameaçam o seu repouso”. “Ela honra, pelo contrário, quando considerar o homem na sua parte mais elevada, quando se ocupa primeiramente de sua alma, de sua educação religiosa, moral e política, de tudo aquilo que o liberta de suas paixões e de uma parte de suas necessidades, de tudo o que o torna livre e de tudo que pode torná-lo grande. A assistência honra quando ela junta ao pão que alimenta a visita que consola, o conselho que esclarece, o aperto de mão que levanta a coragem abatida; quando ela trata o pobre com respeito, não somente como um igual, mas como um superior, já que sofre o que nós talvez não sofreríamos, já que está entre nós como um enviado de Deus para experimentar nossa justiça e nossa caridade, e nos salvar por nossas obras”. Essa assistência torna-se honrosa “porque ela pode tornar-se mútua porque todo o homem que dá uma palavra, um conselho, um consolo hoje, pode ter necessidade de uma palavra, de um conselho, de um consolo amanhã, porque a mão que apertais aperta, por sua vez, a vossa mão, porque essa família indigente que tereis amado vos amará, e que ela terá quitado até em demasia sua dívida, quando aquele velho, aquela piedosa mãe de família, aquelas crianças, tiverem rezado por vós”. 

Finalmente, tomo de uma das aulas da “Escola de Caridade Ozanam” o trecho referente à regra de vida e a Regra da Sociedade. 

A maior parte do que fazemos durante nossa vida são coisas muito corriqueiras... nada fora do comum. Realmente, muito do que fazemos é feito por força de hábito. Quando o costume é bom, nenhum mal há nisso. Porém, há um perigo. Existe grande probabilidade de cair na rotina. Tornamo-nos satisfeitos e nosso conceito de tempo involuntariamente piora. Por exemplo, o que de bom se fez no mês passado, parece que ocorreu na semana que passou. Algo feito seis meses atrás, parece que aconteceu na semana última. Há três coisas a observar a fim de se evitar este perigo... são: método, pontualidade e exatidão. 

MÉTODO - Este costume exige de antemão um plano para colocar o essencial no seu lugar. Levantar-se na hora determinada cada manhã, fornece tempo para coisas que, do contrário, iremos omitir... nossa oração matinal, por exemplo. Com método, tornar-se-á para nós mais fácil ordenar nossa atividade. Se planejamos devidamente o dia todo, teremos oportunidade de não ser caridosos com nossos vizinhos, nossa esposa, nossos colegas de serviços. Simplesmente, não temos tempos para ser algo diferente daquilo que desejamos ser. 

PONTUALIDADE – Oh! Como desgostamos do indivíduo que nunca é pontual. Todavia, nós mesmos podemos desenvolver este hábito tão impopular. Temos todo o desejo de estar pontualmente ali, mas não resistimos à xícara extra de café ou olhar rápido ao jornal. Notamos um bom programa na TV, e a primeira coisa que percebemos é que estamos atrasados de novo. Sem o regime da pontualidade e devoção rigorosa aos princípios, podemos tornar-nos aquela mesma pessoa que nós, e os outros admiramos. 

EXATIDÃO – Devemos lembrar-nos que somos grandes principiantes. Temos a tendência de trabalhar aos arrancos. A única coisa constante em nós é a nossa inconstância. Num momento estamos todos ansiosos... prontos para modificar o mundo... e logo depois o projeto todo é abandonado. Muitas vezes abocanhamos mais do que podemos mastigar. Diz-se que se pudéssemos fazer tão somente coisas pequenas... apenas coisas pequenas com que nos defrontamos durante toda nossa vida... se as fizéssemos bem, cuidadosamente, haveríamos de nos tornar santos. É mais fácil dizer do que cumprir. Conta-se um episódio de Santa Terezinha, a pequena flor, quando era sacristã no convento. Ela tomava cada hóstia e colocava-a com Amor na patena sobre o cálice. Certo dia, uma irmã perguntou à Santa Terezinha porque gastava tanto tempo para executar este simples trabalho, e Santa Terezinha respondeu que cada ação era um ato ofertado a Deus, e por isso, devia ser feito com atenção, meticulosamente. Poderíamos seguir tal exemplo em nossas obrigações diárias?. 

Em decorrência de tudo isto, para darmos testemunho de nossa fé, deveremos ter em vista a Regra da Sociedade. Ainda aqui, vale a pena transcrever mais um trecho da “Escola de Caridade Ozanam”. 

OBJETIVO: O objetivo ou fim principal da Sociedade é o bem espiritual dos seus confrades e consocias. Este é o objetivo mais importante da Sociedade e o mais fácil de esquecer. A Sociedade oferece oportunidade, uma oportunidade concreta, de fazer um bom serviço junto à satisfação de mútua cooperação. Fornece-nos uma organização continuamente ativa na qual fazemos nosso trabalho. Quantas vezes perto de nós a senhora Generosidade.... as multidões que cercam os órfãos na época de Natal. Um incêndio destrói a casa e presentes chegam de todas as partes; um marido mata sua esposa e cada um quer tomar conta das crianças... por alguns dias. Não é objetivo dos membros da Sociedade perceber o brilho suave ou ver agradecimento nos olhos do recebedor, embora isso seja reação natural e nenhum mal há nisto. Quando pensamos seriamente sobre isto, não damos muito aos pobres. Eles, porém, está nos dando tudo... eles oferecem-nos a oportunidade para estornar o amor ao modo de Cristo, o nosso amor a Deus. Eles oferecem-nos a oportunidade de nos aperfeiçoarmos espiritualmente. 

VISITA PESSOAL – Como conseqüência disto, a primeira e principal obra da Sociedade é a visita pessoal e a ajuda aos necessitados; mas nenhum empreendimento de Caridade está alheio ao seu alvo. A primeira coisa que vamos sublinhar nesta regra, é “visita pessoal e ajuda aos necessitados”. Isto demonstra duas coisas. Primeiro que não podemos enviar uma cesta para uma família pobre. Segundo, que não exigimos que eles venham a nós. Ela diz que devemos fazer uma visita. A visita quer dizer entrar na casa, sentar-se e dar sinal de presença. Isto quer dizer que sempre visitamos como amigos. 


COMO – “A assistência material oferecida aos pobres deve sempre ser efetuada com bondade e simpatia, e uso prudente do conselho adequado”. Devemos esforçar-nos a ir ao encontro dos pobres como se levássemos nosso auxílio a Cristo. Somos os pastores que caminham para a manjedoura. Por nosso intercâmbio social, nossa paciência e nosso exemplo e nossa compreensão, esperamos guiar a família ou o indivíduo, para mais perto de Deus. Por exemplo, não dizemos: “aqui está sua encomenda do armazém”... “Veja se aguenta até a semana vindoura”. Nós permanecemos junto à família o tempo necessário para dar-lhe oportunidade de falar. Não nos consideramos como mercearia ambulante. 


DAR-SE – Nenhuma joia de admissão é esperada ou aceita e nenhuma taxa e coleta dos membros, porém, as consocias e os confrades devem ser generosos em suas contribuições para o caixa da Conferência. Cada consocia ou Confrade deve ser generoso quanto suas posses permitirem dar à coleta secreta das reuniões semanais ! O compromisso importante aqui assumido está em que nosso trabalho na Sociedade é secreto. Isso inclui a coleta secreta. Não dizemos que alguém deve dar uma quota determinada, mas, em oferecendo, sabemos que o dinheiro não vai para a Sociedade, porém, para os pobres. A regra também menciona que demos mais do que assistência material, isto é, que nos demos a nós mesmos... e nos sacrifiquemos por aqueles que estão necessitados. 


OZANAM E A VISITA DOMICILIAR – Assim escreveu Ozanam à seu irmão: “É surpreendente, neste tempo, ver os trabalhos de caridade inspirarem tamanha devoção na Sociedade, na França, a qual foi tão perturbada, por mais de meio século, por muitas doutrinas, tão sacudida por escândalos em casa, e tão menosprezada no exterior”. 

Nessa devoção ninguém ultrapassava o próprio Ozanam. A visita ao pobre, em sua própria casa, é o trabalho fundamental da Sociedade de São Vicente de Paulo e Ozanam era o belo ideal do vicentino visitante. Naturalmente austero, quase severo de semblante, a sua expressão mudava inteiramente quando entrava nos humildes lares dos pobres. Seus olhos brilhavam, a linha severa de sua boca suavizava-se e, com a cabeça descoberta, tomava o assento a ele oferecido e começava a conversar carinhosa e simplesmente sobre tudo que interessasse aos seus pobres protegidos. Não havia nem reserva, nem indevida familiaridade – qualquer delas podia bem ser melindre – em seus modos; ele não tratava com ar de superioridade nem também como quem pregava. Ele era o gentil, simpático e cordial amigo que ganhava confiança sem procura-la e dava conselhos, encorajamento e onde necessário, palavras de advertência, mas de modo que não pudessem ofender as susceptibilidade dos mais sensíveis. Em acréscimo ao normal vale de provisões*), diligenciava, de tempos a tempos, dar um pequeno regalo, uma inesperada atenção de alguma espécie, alguma surpresa agradável que fosse direta ao coração do recebedor. Também, e sempre, Ozanam sentia que era ele que era o recebedor e os seus pobres amigos os doadores. Tinha, como ele próprio disse, “uma inspiração que me força a visitar os meus pobres protegidos nos dias em que estou de mau humor, e que me faz sair deles sentindo-me inteiramente humilhado com as minhas misérias imaginárias à vista da terrível realidade de suas aflições”. 

       
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Palestra proferida durante a Reunião Interprovincial promovida pelo Conselho Metropolitano de São Paulo da Sociedade de São Vicente de Paulo.      

*) VALE DE PROVISÕES: substituído pela cesta básica ou sacola de alimentos.

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